Bioeconomia ganha força entre as empresas da Zona Franca de Manaus

Destravar a bioeconomia amazônica, com redução do desmatamento, aumento da renda e inclusão social, requer o desenvolvimento de negócios inovadores nos vários elos das cadeias de produtos da floresta. Da gestão empreendedora na base das comunidades à logística de transporte e rastreio da matéria-prima, novas tecnologias se combinam em todo o processo desde as árvores e a venda final ao consumidor, no conceito de “bioeconomia integrada”. Em busca de escala e viabilidade comercial, considerando a realidade regional, o modelo ganha força entre empresas da Zona Franca de Manaus, que diversificam investimentos antes exclusivos do setor eletroeletrônico, com aposta na economia baseada na floresta em pé.

“Precisamos sair do casulo dos incentivos fiscais para ajudar a região a ser mais competitiva com desenvolvimento sustentável”, afirma Mariana Barrella, CEO da Tutiplast. Com faturamento de R$ 400 milhões por ano, em Manaus, a indústria de peças para celulares e computadores articulou com a Samsung investimento de R$ 2 milhões para produzir bioplástico de alta resistência a partir da castanha-do-pará e tucumã – fruto de palmeira bastante usada na alimentação regional. A empreitada tem parceria com laboratórios da academia.Precisamos sair do casulo dos incentivos fiscais para ajudar a região a ser mais competitiva” — Mariana Barrella

A estratégia de ponta a ponta representa um novo paradigma do extrativismo na Amazônia, frente a mercados exigentes nas questões socioambientais. “Para mudar o padrão que funciona como nos séculos anteriores, é preciso investir em gestão e embutir ciência e tecnologia nas cadeias produtivas da sociobiodiversidade, com resultados mais efetivos de longo prazo”, afirma Paulo Simonetti, líder de captação e relacionamento com o investidor do Programa Prioritário de Bioeconomia (PPBio).

A iniciativa, coordenada pela Idesam, ONG voltada ao uso sustentável da Amazônia, é uma política pública da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) para o repasse de recursos obrigatórios de pesquisa e desenvolvimento pelas indústrias, conforme a Lei de Informática. Ao completar quatro anos, o PPBio soma R$ 91 milhões em aportes por 34 empresas investidoras, com 31 projetos em execução ou já concluídos. São principalmente bionegócios que solucionam gargalos das cadeias desde a origem na floresta – como boas práticas de manejo, capacidade de fornecimento, preços e padrões de qualidade – de modo que óleos vegetais, pirarucu, açaí, castanha-do-pará e outros produtos cheguem na ponta final aliando cultura tradicional e visão de mercado.

Novos arranjos potencializam investimentos, como a parceria possibilitando que recursos do PPBio cubram a contrapartida de startups para acesso a repasses da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação (Embrapii), que anunciou R$ 30 milhões para bioinovações na região Norte, via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), durante cinco anos. Neste primeiro ano, 25% já foram comprometidos para projetos com plantas medicinais, piscicultura e manejo madeireiro sustentável. “O objetivo é estimular soluções inovadoras a partir da própria região”, diz Marcela Mazzoni, gerente de novos programas da Embrapii. Para empresas de menor porte, o apoio pode atingir 50% do investimento total, realizado em parceria com instituições científicas e tecnológicas da região.

Segundo estudo da Associação Brasileira de Bioinovação (ABBI), o uso sustentável de recursos biológicos é fundamental para atender tanto as metas climáticas mais restritivas quanto o desenvolvimento do país, podendo representar mais US$ 284 bilhões ao ano injetados na economia brasileira. Para tanto, diz o estudo, é necessário um investimento da ordem de US$ 45 bilhões.

“Mas faltam dados de bioeconomia confiáveis à tomada de decisão”, diz Eduardo Roxo, cofundador da empresa Atina, em evento que lançou, em maio, uma nova plataforma que sistematiza informações das cadeias produtivas da Amazônia. O painel, iniciativa da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura e Uma Concertação pela Amazônia com apoio do Fundo JBS, começou pelas cadeias de cacau, babaçu e açaí – o carro-chefe, cuja produção representou R$ 6,4 bilhões na região, em 2021.

Recente estudo do Banco Mundial estima que a preservação da floresta vale, ao menos, US$ 317 bilhões por ano (cerca de R$ 1,6 trilhão). Mas o atual cenário mostra que “a região virou as costas para a floresta”, lamenta Salo Coslovsky, professor da Universidade de Nova York, autor de levantamento indicando que as exportações de produtos da região representam apenas 0,17% de um mercado potencial de US$ 176,6 bilhões.

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