Plano Safra “verde” enfrenta resistência da área econômica

Fonte: Valor Econômico

O Ministério da Agricultura tem encontrado resistências para emplacar o desenho do Plano Safra + Sustentável 2023/24 nas negociações com a equipe econômica do governo, segundo fontes que participaram das últimas reuniões em Brasília sobre o assunto.

A proposta da Agricultura prevê a redução de até 3 pontos percentuais na taxa final de juros nos financiamentos a partir de julho para grandes produtores que adotarem algumas práticas sustentáveis nas suas atividades. Para os médios, o desconto seria de até 2 pontos percentuais ou 25% da alíquota da linha do crédito rural.

Apesar de bem recebida pelo restante do governo, principalmente pelo caráter verde e sustentável, a proposta é avaliada como cara, disseram as fontes. Se adotada, deverá consumir boa parte dos R$ 18,5 bilhões de orçamento que o ministro Carlos Fávaro solicitou à equipe econômica para o ciclo 2023/24, quando pretende ter mais de R$ 400 bilhões para as linhas de financiamentos.

A contraproposta apresentada pelo Ministério da Fazenda em reunião semana passada foi de cerca de R$ 5 bilhões para subvencionar juros para médios e grandes produtores, disseram dois participantes. Para a agricultura familiar, foram sugeridos R$ 8 bilhões para a equalização do Pronaf.

Técnicos defendem que apenas com esse programa de premiar práticas sustentáveis será possível oferecer alguma redução de juros. Sem os incentivos, as taxas do Plano Safra da agricultura empresarial podem ficar nos mesmos 8% para os médios produtores e 12% para os grandes desta temporada.

Além disso, o programa seria a medida prática do plano para estimular a produção agropecuária sustentável cobrada nos discursos do presidente Lula e da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.A conta da política agrícola é pequena em comparação ao que o setor gera” — José Carlos Vaz

Os impactos financeiros da medida ainda estão sendo calculados pela Fazenda. Uma fonte do governo afirmou que a equipe econômica sugeriu que a redução fosse de até 1,5 ponto percentual.

Outra dificuldade apontada na negociação é a regulamentação dos incentivos e as formas de verificação das boas práticas por produtores, disseram participantes das reuniões. O Ministério da Agricultura defende requisitos simples e fáceis de serem checados.

O orçamento da equalização de um Plano Safra é dividido em vários anos, mas a estimativa no governo é que seria necessária uma suplementação de mais de R$ 12 bilhões no caixa de 2023 para bancar os pedidos feitos pelos ministérios. O desafio é de onde sairão os recursos. O tema tem sido debatido na Casa Civil, que media possíveis remanejamentos dos cofres de outras Pastas, disse outra fonte.

A proposta apresentada pelo Ministério da Agricultura para incentivar e premiar a adoção das práticas sustentáveis sugere que produtores que tenham o Cadastro Ambiental Rural (CAR) ativo, por exemplo, recebam 5% de desconto na taxa de juros. Para quem já tiver o cadastro analisado, etapa que verifica as informações autodeclaradas das propriedades rurais, a redução seria de 10%.

Os descontos significariam 0,4% e 0,8% da taxa atual de 8% no Pronamp, respectivamente, e de 0,8% e 1,2% para os juros de 12% dos demais produtores.

A mesma lógica seria aplicada para produtores que tenham participado de treinamentos sobre a aplicação de regras trabalhistas no campo.

Para o uso de bioinsumos, o pré-requisito seria a adoção do descarte correto da embalagem – no âmbito da política da logística reversa – e a comprovação seria pela nota fiscal de compra. A medida valeria para fertilizantes biológicos e pó de rocha e calcário, que podem ser usados em pastagens para a pecuária bovina.

Há incentivo também para quem promover reflorestamento e práticas como a rastreabilidade individual do gado por pecuaristas, instalação de placas fotovoltaicas para avicultores e tratamento de dejetos para geração de biogás para os suinocultores. Uma novidade seria a criação da “Cédula Sempre Verde” que serviria para financiar de uma só vez a safra e a safrinha.

Os produtores poderiam acumular no máximo cinco desses critérios, o que proporcionaria desconto máximo de 25% nos juros finais. No Pronamp, a alíquota sairia de 8% para 6%. Para os grandes agricultores e pecuaristas, a taxa sairia de 12% para 9%, no desenho original da proposta.

Uma das críticas é que a taxa final do Pronamp para quem acumular os incentivos chegaria aos juros do Pronaf, em 6%. No Plano Safra da Agricultura Familiar, a produção de itens como arroz, feijão e mandioca, e produtos da sociobiodiversidade deverão ter alguma redução de alíquotas.

José Carlos Vaz, consultor jurídico do agronegócio, diz que o governo acerta com a ideia de premiação sustentável, mas que o ideal seria fazer isso na apuração anual do resultado econômico da atividade, mediante crédito direto no bolso do produtor. Sobre o custo para incentivar as práticas via crédito rural, ele afirma que “a conta da política agrícola brasileira é sempre pequena em comparação com o que o setor gera, mas que a questão é a capacidade financeira do Tesouro Nacional”.

O economista-chefe da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), Antônio da Luz, afirma que se o governo vai premiar práticas sustentáveis, precisará “de muito dinheiro mesmo”. “A agricultura comercial brasileira é toda sustentável, sobretudo quando comparamos com as metodologias de produção europeia e americana”, defende.

Expectativa

Com a viagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva esta semana para a Europa, o Plano Safra 2023/24 deverá ser anunciado apenas na última semana de junho, o que já tinha ocorrido do ano passado. Na última semana do mês, Lula já estará de volta para lançar o plano ao lado do ministro da Agricultura Carlos Fávaro. A reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN) que deverá votar as resoluções do Plano Safra está agendada para a próxima quinta-feira (29), mas um encontro extraordinário não está descartado.

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