OPERAÇÕES DE M&A

CONSIDERAÇÕES SOBRE ALGUNS ATOS E FASES DO PROCEDIMENTO

Por: André Papini

            1. Introdução

Os procedimentos envolvidos nas operações de M&A não são simples. Inúmeras são as variáveis que podem influenciar nos atos a serem praticados e nas etapas a serem seguidas. Só para exemplificar, podemos citar algumas, como o grau de maturidade das empresas envolvidas em termos de governança corporativa, o porte das empresas e atividades desenvolvidas, os tipos de ativos negociados (ações, quotas, imóveis, debêntures, estabelecimentos etc.), a abrangência da aquisição pretendida (parcial ou total), a natureza ou perfil do investidor (estratégico ou financeiro), a nacionalidade do investidor, a sujeição ou não da operação a entidades públicas regulatórias (CVM, CADE, ANS, ANATEL etc.), a existência ou não de políticas de compliance, especialmente no âmbito da empresa alvo, a maior ou menor especialização e experiência dos assessores envolvidos na operação (jurídicos, financeiros, contábeis etc.), dentre outras.

Muito em razão das inúmeras variáveis, como as mencionadas acima, não existe um procedimento único a ser adotado para a condução de uma operação de M&A. Não obstante, de um modo geral, é possível visualizar alguns marcos ou etapas mais recorrentes, como os apresentados nas breves considerações a seguir.

            2. Alguns Atos e Fases da Operação

Acordo de Sigilo e Confidencialidade (NDA – Non Disclosure Agreement)

O Acordo de Sigilo e Confidencialidade (NDA – Non Disclosure Agreement) comumente é o primeiro contrato formalizado entre o potencial comprador/investidor e a empresa alvo (sociedade, sócios, acionistas etc.). Seu objetivo é conferir a recomendável segurança jurídica para a primeira troca  de documentos e informações entre as a partes envolvidas, que assumem a obrigação de guardar sigilo e confidencialidade em relação ao seu conteúdo, ou mesmo quanto ao fato de estarem mantendo conversas preliminares.

O acordo que tem por objeto exclusivo a obrigação de sigilo e confidencialidade costuma ser utilizado em fase extremamente embrionária de uma operação, normalmente quando as partes estão mantendo contatos apenas verbais, sem que tenha havido a disponibilização de documentos e informações preliminares mais detalhadas, especialmente pela empresa alvo, e sem que exista ainda uma oferta de aquisição. De forma diversa, pode aparecer como cláusula de instrumento preliminar formalizado entre as partes, conforme se verá adiante.

As penalidades para o descumprimento da obrigação de sigilo e confidencialidade podem variar desde a estipulação de valores certos a título de multas, até a previsão de indenização pelos prejuízos sofridos pela parte inocente.

Instrumento Preliminar

Após as primeiras negociações e, normalmente, após a aceitação pela empresa alvo de uma oferta de aquisição, evoluindo as partes para o consenso na continuidade da operação, pode ser formalizado acordo ou instrumento preliminar que, apesar de ainda não vincular as partes, ou seja, não obrigá-las a efetivar a aquisição, contém cláusulas essenciais para apontar o norte para que ela possa acontecer, registrando os principais aspectos e premissas considerados para a mútua decisão de avançar com o processo de negociação, e estabelecendo regras e prazos para as próximas etapas da operação.

No mínimo, é recomendável que o referido instrumento regule a intenção da aquisição, o seu objeto (aquisição de ações, quotas, ativos etc.), o valor da oferta, os critérios para apuração do preço e forma de pagamento, a estrutura contratual e societária a ser observada e implementada, a exclusividade (ou não) negocial ente as partes, as regras e o prazo para realização de auditoria (due diligence) pelo potencial comprador na empresa alvo, a obrigação de sigilo e confidencialidade, dentre outras questões.

MOU (Memorandum of Understanding), Term Sheet e Letter of Intent  (aceite pela outra parte) são exemplos das diversas formas que costumam materializar os instrumentos preliminares nas operações de M&A.

Auditoria

Uma vez formalizado o instrumento preliminar, e a partir de regras geralmente nele fixadas, o potencial investidor/comprador promove auditoria na empresa alvo com o objetivo de, a partir da análise de documentos e informações solicitados, obter conhecimento mais preciso e detalhado sobre a empresa alvo que lhe permita identificar eventuais situações de risco que possam impactar, por exemplo, a segurança jurídica do negócio, o preço de aquisição e as garantias necessárias, ou mesma embasar decisão de desistência do negócio, caso os riscos sejam muito elevados.

Conhecida como due diligence, a auditoria avalia questões de natureza tributária, trabalhista, societária, contratual, ambiental, regulatória, contábil, imobiliária, dentre outras, que variam de acordo com as particularidades da empresa alvo, especialmente o seu porte e ramo de atuação.

Reorganização Societária

Não raramente, o potencial investidor/comprador exige algum tipo de medida de natureza societária na empresa alvo como condição para a aquisição, por diversas razões como planejamento tributário, exigência legal, compliance, adequação a práticas de governança corporativa, dentre outras. Desde que a empresa alvo, obviamente, concorde com tal condição – o que normalmente vem regulado no instrumento preliminar –, compete aos assessores jurídicos a idealização e a implementação dos atos societários necessários.

É comum que a implementação da reorganização societária seja uma condição precedente de fechamento da operação, ou seja, que a transferência das ações, quotas ou outros ativos pelo vendedor, e o pagamento do preço pelo investidor/comprador somente ocorra após a implementação da estrutura societária exigida.

A título de exemplo, imaginemos uma operação de aquisição parcial de participações societárias em uma sociedade limitada, ou seja, uma situação em que os sócios vendedores continuarão a integrar o quadro social, recomendando, portanto, a celebração de pacto parassocial entre eles (comprador e vendedores, agora sócios) a fim de regular matérias como venda de participações societárias, direito de preferência, exercício do direito de voto, dentre outros. Neste caso, sendo a sociedade originariamente do tipo limitada, o comprador poderia exigir a sua transformação prévia em sociedade anônima, a fim de ser negociado e posteriormente firmado um acordo de acionistas, considerando a maior segurança jurídica conferida por tal instrumento se comparado com o acordo de quotistas de uma sociedade limitada.

Contrato de Aquisição

A assinatura (signing) do contrato de aquisição instrumentaliza o negócio firmado entre as partes. É comum (não é regra) que a sua primeira minuta seja apresentada pelo potencial investidor/comprador logo após a assinatura do instrumento preliminar (MOU, Term Sheet etc.), e mesmo antes do início da due diligence, viabilizando o imediato início da negociação dos seus termos e condições entre os assessores jurídicos das partes, já que se trata do mais complexo e importante contrato, tratando de temas como objeto, preço, forma de pagamento, retenção de parcela do preço, ajuste de preço, earn-out, garantias, responsabilidades por perdas e respectivos procedimentos de indenização, declarações e garantias, condições precedentes ao fechamento da operação, não concorrência, forma de solução de conflitos (mediação, arbitragem etc.) dentre outros.

As negociações envolvendo o contrato principal representam uma das fases mais complexas de toda a operação, intensificando-se na medida em que o potencial comprador/investidor passa a conhecer mais detalhes da empresa alvo em razão da due diligence, com ênfase para aspectos envolvendo responsabilidades futuras por eventuais perdas e garantias a serem prestadas pela empresa alvo.

Em conjunto com a minuta do contrato principal são também negociadas as minutas dos contratos acessórios, a exemplo de alteração de contrato/estatuto social, acordo de acionistas/quotistas, ata de nomeação de administradores, instrumento de renúncia de administradores, aditivos de contratos comerciais firmados entre a empresa alvo e terceiros (cliente e fornecedores) em razão de alteração do controle (quando for o caso), dentre outras.

Os contratos principais envolvendo a compra e venda de participações societárias de sociedades anônimas e limitadas também são conhecidos, dentre outras nomenclaturas, por SPA (Share Purchase Agreement) ou QPA (Quota Purchase Agreement).

Pré-fechamento

A assinatura do contrato de aquisição não necessariamente efetiva simultaneamente a compra e venda. Ou seja, muito embora o negócio seja formalizado a partir do signinig, a transferência dos bens adquiridos (ações, quotas etc.) e o pagamento do preço (no mínimo a entrada) podem ser postergados para ato posterior, conhecido por fechamento (closing), que será abordado adiante. Tal situação decorre, por exemplo, da previsão de condições precedentes ou suspensivas no contrato, de natureza convencional (ex.: transformação da sociedade limitada em sociedade anônima) ou legal (ex.: autorização da operação pelo Conselho Administrativa de Defesa Econômica – CADE, se for o caso), cuja verificação ou renúncia (quando possível) pelas partes seja requisito para o fechamento ou efetivação da operação.

Assim, na fase pré-fechamento (posterior ao signing e anterior ao closing) as partes devem praticar todos os atos possíveis para que as condições precedentes ou suspensivas sejam verificadas ou, se for o caso, sejam objeto de renúncia.

Fechamento

O fechamento (closing) traduz a efetivação da operação mediante a verificação ou renúncia das condições suspensivas ou precedentes, a transferência dos ativos adquiridos e o pagamento do preço, a renúncia, destituição e nomeação de administradores, a assinatura de acordos de acionistas ou de quotistas, as anotações nos livros de transferência e de registro de ações, a assinatura de atas de assembleias e a assinatura de contratos acessórios.

Atos Posteriores ao Fechamento

Mesmo após o fechamento da operação, a prática de determinados atos pode se fazer necessária, como, por exemplo, o arquivamento perante o registro de empresa de atos societários formalizados no closing (ata de assembleia, alteração de estatuto ou de contrato social, instrumento de renúncia de administradores etc.).

            3. Conclusão

Como anunciado no início, nosso objetivo foi trazer alguns dos atos e etapas mais recorrentes nos procedimentos que tocam operações de M&A, ainda que não exista uma forma obrigatória ou padronizada a ser seguida.

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